“Comunas” eram casas comunitárias com modo de vida alternativo em Copenhagen na década de 70      Fotos: Divulgação
“Comunas” eram casas comunitárias com modo de vida alternativo em Copenhagen na década de 70 Fotos: Divulgação

“A Comunidade” é o fim da festa da nova família

DaniPrandi_0188c_500O dinamarquês Thomas Vinterberg morou em uma “comuna” com os pais e outras famílias dos 7 aos 19 anos de idade, em meados dos anos 1970. “Comuna” era o nome das casas comunitárias que tinham virado um modo de vida viável e alternativo em Copenhagen. O cineasta de filmes cultuados, como “A Caça” e “Festa de Família”, resolveu remexer suas lembranças e, em “A Comunidade”, retrata uma sociedade alternativa que tem liberdade, mas também regras e desilusões, apesar da sensação de aconchego que é a ideia de morar rodeado de gente em tempos pós-revolução sexual.

O filme lembra um pouco a atmosfera de “Festa de Família”, de 1998, marco criativo do movimento Dogma, que privilegiava a luz e o som natural, entre outras revoluções. Além de mostrar de dentro a experiência de montar uma comunidade, Vinterberg remexe em outras emoções ao focar no doloroso processo de separação do casal central do filme, Erik (Ulrich Thomsen) e Anna (Trine Dyrholm), um professor universitário e uma âncora de televisão, pais da adolescente Freja (Martha Sofie Wallstrom Hansen).

O cineasta Thomas Vinterberg resolveu remexer suas lembranças em “A Comunidade”, onde retrata uma sociedade alternativa, com liberdade e regras Fotos: Divulgação
Thomas Vinterberg remexeu suas lembranças em “A Comunidade”, onde retrata sociedade alternativa

Erik herda a casa da família mas, como os custos da propriedade vão além de suas rendas, é convencido pela mulher a chamar amigos e amigos de amigos para morar e dividir as despesas. Os tempos são de vale tudo, como nadar pelado na maior felicidade, como bem mostra uma das sequências iniciais. Mas a festa da nova família no meio dessa ideia de utopia acaba por revelar os dilemas e os dramas de sempre, como ciúmes, machismo, mesquinharia e rabugices, afinal, de perto ninguém é normal.

O primeiro a chegar é Ole (Lars Ranthe), que pode ter algo mais que uma amizade por Anna. Outros são integrados ao grupo, e um sistema de vida começa a se impor, onde todos são responsáveis e as decisões são pelo voto, e nem sempre sai o resultado esperado. Não demora para que alguns tentem mandar, outros desobedecer, outros ignorar, mas há um certo equilíbrio nas relações. Até que Erik acaba alterando a balança quando começa um romance com uma de suas alunas, Emma (Helene Reingaard Neumann), e decide pedir a separação.

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O casal central, Erik (Ulrich Thomsen) e Anna (Trine Dyrholm), vive uma dolorosa separação

A atriz que interpreta Emma é a nova esposa do cineasta Vinterberg, que separou-se depois de 20 anos de casamento e dois filhos, e destaca-se por sua beleza, com um ar de Brigitte Bardot nórdica. O tema separação não está ali por acaso. O diretor viu seus pais terminarem o casamento quando moravam em uma comunidade. Vinterberg conta que continuou na casa mesmo depois que eles se mudaram porque, segundo disse em entrevista, “queria continuar a me sentir amado”.

Em uma atitude impensada, Anna diz a Erik para trazer a nova companheira para morar na casa também. Mas não suporta os ciúmes, a perda e a humilhação, entra em depressão, o que atrapalha seu trabalho, e vai para o fundo do poço emocional. Pela impressionante atuação, a atriz Trine Dyrholm foi premiada no Festival de Berlim em fevereiro deste ano.

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Emma (Helene Reingaard Neumann) tem um caso amoroso com Erik e vai morar na casa comunitária

Não à toa, hoje a maioria não mora em casas comunitárias e quer o seu cantinho, já que os tempos são de liberdade individual e direito a privacidade. Essas experiências não resistiram e atualmente o conceito de vida em comunidade passou a representar muito mais no mundo virtual do que no real. Mas Vinterberg ainda acredita: “Não vejo a comunidade como utopia. A vantagem do coletivo é que ele torna a vida mais suportável.”

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Sobre Daniela Prandi

Daniela Prandi, paulista, jornalista, fanática por cinema, vai do pop ao cult mas não passa nem perto de filmes de terror. Louca por livros, gibis, arte, poesia e tudo o mais que mexa com as palavras em movimento, vive cada sessão de cinema como se fosse a última.

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3 comentários

  1. Dani, texto delicioso. Louca pra ver o filme!