Aos 81 anos, Eleanor Coppola estreou na direção com um filme que nos convida para uma viagem de redescobertas. Sem se intimidar com o fato de ser mulher de Francis F. Coppola e mãe de Sofia Coppola, a “novata” no cinema de ficção (já que já dirigiu um documentário) resolveu se inspirar em um episódio de sua vida ao escrever o roteiro de “Paris pode Esperar”, um delicioso road movie que revela sabores e muito mais em uma viagem de carro de Cannes a Paris.
A protagonista Anne, interpretada com leveza e humor por Diane Lane, é a esposa de um magnata do cinema (Alec Baldwin) que está no Festival de Cannes a trabalho. Enquanto espera, gosta de observar pequenos detalhes aqui e ali e fotografa sem parar, com uma pequena e discreta máquina automática.
Anne é o alter-ego de Eleanor, logo entendemos. Negligenciada pelo marido, sempre ocupado entre telefonemas e reuniões, é uma mulher de meia-idade que perdeu o protagonismo de sua vida. Por causa de uma dor de ouvido, não poderá pegar o voo previsto para acompanhar o marido em Budapeste e um parceiro de negócios, Jacques (Arnaud Viard), se oferece para levá-la, de carro, um velho Peugeot, até Paris.
Nesta viagem, que deveria durar sete horas mas leva dois dias, atravessa o bucólico interior da França com direito a muitas paradas, muitas fotos, muitas refeições, muitos queijos e muitas taças de vinho, a mulher se reencontra na companhia de outro homem, por mais que o romance não exista. O reencontro é com a alegria de viver, que os franceses sabiamente chamam de joie de vivre. Praticamente uma escrava do celular, sempre ansiosa por notícias do marido e da filha, que acaba de entrar na faculdade, Anne percebe que a vida, afinal, é muito mais.
Como em todo road movie, chegar importa menos do que estar em movimento. É no caminho que Anne conquistas suas redescobertas, sempre acompanhada de uma boa refeição. E olhe que são muitas. Por isso, um aviso: não veja o filme de estômago vazio.
Ela redescobre sua posição como esposa e mãe, sua feminilidade, seu “poder” em ser e gostar de ser mulher, já que Jacques, como um francês típico de um filme, flerta sem parar. Bon vivant, fumante, falador e cheio de charme, Jacques é a personificação do clichê de um homem francês visto nas telas de cinema, e em nenhum momento força a barra.
A cada cidade, a cada desvio, há um restaurante para conhecer, um vinho para provar, uma paisagem para ser fotografada, uma novidade para conferir. O final da viagem é adiado a cada momento e uma das paradas mais emocionantes é em Lyon, onde eles visitam um museu dedicado aos irmãos Lumière, pais do cinema, em uma bela homenagem à Sétima Arte.
No jogo de cena criado pela diretora, somos induzidos a desconfiar de Jacques. Será que ele realmente está gostando da companhia de sua parceira de viagem ou tem outras intenções? Afinal, ele pede a Anne que pague as contas com seu cartão de crédito e em determinada cena parece abandoná-la em um posto de gasolina, até reaparecer com flores. Neste jogo de camadas entre o que é real e o que importa nas relações humanas, a história tem um desfecho que alivia. Eleanor, que antes de “Paris pode Esperar” tinha feito um documentário sobre o difícil processo de produção de “Apocalypse Now”, dirigido por Francis F. Coppola em 1979, consegue imprimir um olhar terno em um filme que emociona.
Eleanor Coppola, na juventude de seus 81 anos, que passou boa parte da vida respirando cinema, fez um filme “de coração cinéfilo”, que compartilha com generosidade algumas das questões mais pertinentes da vida das mulheres. Nós só temos que agradecer.
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