Ligia Testa_Macc_Destacada

A Arte Existe sem Contemplador?

Lígia TestaA pergunta vem-me passeando por entre as sinapses e os escassos momentos de fazer nada. O que é um museu com paredes plenas de obras de arte e mergulhado no mais absoluto vazio? Não há passos vagarosos, cochichos sobre a impressão causada por aquela imagem, desejos de se ter aquela obra em casa ou de ser a última que se escolheria no mundo, a correria das crianças. O que são as obras instaladas na mais perfeita expografia, milimetricamente colocadas para satisfazer o desejo que nosso cérebro sente pela simetria?

Um dia, entrelaça-se, a essa, uma outra pergunta que me instigava quando criança: se uma árvore cair e não houver ninguém por perto, haverá barulho?

Em tempos de Google, impossível não encontrar os esconderijos das perguntas impossíveis de outros tempos. A resposta é não! O som não existe pois ele é apenas uma sensação, uma percepção das vibrações sonoras. Assim, ‘quando uma árvore cai, ela não produz barulho, mas sim, vibrações sonoras no ar atmosférico’ que se tornam som ao atingir nossos ouvidos. Também os cheiros ‘são apenas moléculas odorantes no ar capazes de ativar os receptores olfatórios decodificados no córtex’.

Ligia Testa_Macc_Destacada

 

E a arte é emoção. Sem o contemplador dela, a emoção se perde, a arte não existe.

O ar está impregnado por tudo aquilo que a arte pode produzir, como alegria, indignação, raiva, força, enfim, ela é uma energia transcendental que viaja com destreza até nosso inconsciente mais profundo. Sem o contemplador dela, porém, tudo isso se perde, a arte não existe.

E a arte envolve um processo que esbanjou energia do criador e que estabelece uma troca entre ele e quem a contempla. A arte é um alívio neste mundo de atrocidades e consumos exacerbados, ela transforma e expande a consciência. Sem o contemplador dela, porém, tudo isso se perde, a arte não existe.

E a arte contemplada é uma forma de oração, um prazer elevado, uma conexão com o universo. Se as pessoas – cada vez mais afastadas e mais envolvidas consigo mesmas – passam a contemplar a arte, forma-se uma espécie de elo entre elas, aproximando-as com uma espécie de comunicação mais fácil. Sem o contemplador dela, porém, tudo isso se perde, a arte não existe.

Ernest Fischer disse que a função da arte não é a de passar por portas abertas, mas a de abrir portas fechadas. Sem o contemplador dela, porém, ela abre as portas e encontra a casa vazia.

Sobre Lígia Testa

Formada em Ciências da Computação mas absolutamente apaixonada por Arte e estudante de Arte desde sempre sem saber e, há uns bons anos, sabendo, atuando, e que assim seja até o final do meu tempo.

21 comentários

  1. Vicente Magalhães

    Ligia, parabéns e obrigado pelo belo artigo!

  2. paulo de tarso coutinho viana de souza

    cara lígia

    que bom ver suas palavras neste site. que assim continue para que possamos desfrutar de sua inteligencia. bjão paulo de tarso

  3. Marília Cotomacci

    Muito belo texto, Lígia Testa! Brilhante, como sempre!

  4. Marília Maia

    Lígia ,que belo texto e bela reflexão !adorei !

  5. Marcio Rodrigues

    Parabéns Ligia. Sucesso.

  6. Ligia querida!
    Que texto de uma simplicidade e clareza que me tocou profundamente em poucas palavras! Vibro com esses olhares que envolvem a arte como princípio natural da humanidade. Desde sempre, se é que ouso reconhecer os milênios. Mas você soube colocar em pauta o saber artístico. Loas.

    • Almir, meu querido, seu retorno como amigo conhecedor de arte é uma honra para mim. Você é muito responsável pelo desenvolvimento desta minha caminhada. Beijo carinhoso!

    • mário gravem borges

      É verdade! A Ligia explicou de forma eloquente e enxuta toda a envergadura do tema Arte e Interpretante. Disse tudo, inclusive com as naturais reverberâncias para nosso tempo e geografia!

  7. Parabéns Ligia, que venham muitos outros textos deliciosos como este!

  8. Parabéns Lígia!

  9. Parabéns Ligia Maria! Parabéns ASN!
    Ligia, seu texto é de uma precisão definitiva. Pelas palavras claro, porque você as domina, mas principalmente por traduzir de forma completa e indiscutível essa manifestação humana que tem a idade da própria civilização.
    A partir de hoje, passou a ser minha definição preferida sobre o exercício da arte.
    Excelente!

  10. Parabéns pelo artigo.
    Seja bem-vinda!!!