A sessão de “Gauguin – Viagem ao Taiti”, uma das atrações do recém-encerrado Festival Varilux, fez muitos artistas trocarem seus ateliês pelo escurinho do cinema. Antes da exibição em Campinas a fila para comprar o ingresso parecia a abertura de uma exposição. Após o filme as rodinhas se formaram, impressões foram trocadas e havia até um clima de confraternização no ar. A arte de Paul Gauguin (1848-1903) segue inspiradora, afinal, para além das polêmicas.
O francês Vincent Cassel encarna muito bem o papel do artista que, nos últimos anos de sua vida, viveu na Polinésia e produziu seus trabalhos mais importantes, como a tela “De onde viemos? O que somos? Para onde vamos?”, o busto “Tête tahitienne” e a escultura em madeira “La maison de Jouir”, por exemplo. Dessa época, porém, vieram as acusações de pedofilia, de apropriação da arte polinésia e de suas atitudes extremamente colonialistas.
Com direção e roteiro de Edouard Deluc, o filme passa longe das polêmicas e está centrado da degradação física e psicológica do artista francês que, entediado com o mundo das artes de Paris, resolve se aventurar além-mar. A viagem ao Taiti e o período em que viveu nas Ilhas Marquesas, na Polinésia Francesa, trouxeram colorido, inspiração e liberdade, mas também doença, falência e miséria.
A beleza de suas telas repletas de cores contrasta com a penúria de uma vida marcada por frustrações. Assim como tantos, Gauguin só teve o seu trabalho reconhecido após sua morte. Enquanto criava alguns de seus quadros mais valorizados hoje nas casas de leilão passava fome e chegou a trabalhar de estivador, com a saúde extremamente debilitada.
O ano é 1891 e Gauguin tenta convencer seus amigos igualmente artistas a embarcar na aventura. “Estou sufocado, tudo é podre, olhem à sua volta”, reclama. O artista acredita que há vida além da contaminação da civilização, mas ninguém o segue. Sua esposa, preocupada com a educação dos cinco filhos, também não o acompanha e o artista encara solitário seu exílio voluntário. Longe da rígida moral europeia e seus costumes, na Polinésia ele conhece Tehura (Tuhei Adams), que se torna sua esposa e musa de muitas de suas pinturas. A jovem, que pelos costumes locais foi dada ao artista por sua tribo, tinha 13 anos.
O filme exibe com minúcia seu processo de criação, a mistura das tintas, os rascunhos, a busca pela pose perfeita, pela luz perfeita. Mas vai além do artista para mostrar os dilemas do homem, que passa a sofrer de ciúmes da esposa taitiana, muitos anos mais jovem. Alguns anos depois, Gauguin morreria solitário e miserável.
O filme reforça a história estabelecida com uma direção de arte caprichada, com a Polinésia em tons de laranja, exuberante como as telas de Gauguin. Com sua arte entre o exótico e o erótico, o artista seria, algum tempo depois, aclamado por uma sociedade cansada das mesmas paisagens.
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