Em “Toni Erdmann”, forte concorrente ao Oscar de melhor filme estrangeiro, o protagonista é o alemão Winfried (Peter Simonischek), que tem um humor bem peculiar. Tira sarro de tudo e de todos e encara a vida como uma grande piada. Sacaneia o carteiro, seu aluno de piano e (muito mais) a própria família. Usa “disfarces”, como uma horrível peruca, carrega uma dentadura maluca no bolso da camisa e, a qualquer momento, se transforma em um outro. Um deles é Toni Erdmann, que o fará se reaproximar da filha, Ines (Sandra Hüller), workaholic mais conectada ao telefone celular do que aos seus.
O terceiro longa da diretora alemã Maren Ade (que estreou em 2003, com “Floresta para as Árvores” e, logo no segundo filme, “Todos os Outros”, levou o Grande Prêmio do Júri do Festival de Berlim, em 2009) pode parecer uma comédia. Aliás, é até possível que o filme provoque risadas. Mas há uma melancolia tão profunda no conflito de gerações que se apresenta que não há propriamente um riso final, somente um gosto amargo. Ah, vá lá: talvez um sorriso “amarelo”.
“Assim é a vida”, suspirou minha vizinha de cadeira no fim da sessão lotada, com plateia respeitosa, após 162 minutos de filme, no final de semana calorento no Rio de Janeiro. “O que é a vida” é a questão que o pai coloca para a filha, quando resolve fazer uma visita surpresa em Bucareste, na Romênia, onde a moça trabalha como consultora, apertada em seus terninhos de executiva bem-sucedida.
A chegada do “estranho” tumultua seu ambiente pessoal e corporativo. A filha, sem ter muito o que fazer, o leva para seus compromissos, que incluem, basicamente, bajular novos clientes em coqueteis onde cada jovem executivo quer mostrar mais serviço que o outro. No mundo das empresas a regra é trabalhar demais e viver de menos e todos seguem o script sem reclamar.
Winfried, professor de música de roupas amarrotadas, cujo fiel companheiro, um velho cão, acaba de morrer, é um alien ali. Pai e filha até que tentam se entender, mas o abismo é maior do que as boas intenções de cada um. Quando coloca a peruca e a dentadura, Toni Erdmann parece “combinar” mais com aquele mundo de aparências e disputas, por mais incrível que isso possa parecer. O personagem constrange, inventa, diz coisas sem sentido e mesmo assim ninguém parece se importar. É até divertido.
O roteiro, da própria diretora, é hábil em mostrar esse jogo de “meu pai não entende, eu não entendo meu pai” de dois personagens que não são fáceis de entender. Há sequências com humor, como a festa de aniversário nudista, quando o pai aparece com uma fantasia inesquecível, mas a melancolia prevalece, principalmente nos esforços que se faz para que a tida frieza germânica possa derreter corações e mentes.
“Toni Erdmann” tem figurado nas listas dos melhores filmes de 2016 organizadas por revistas como Cahiers du Cinéma, Sight and Sound e Film Comment e desde sempre é o favorito ao Oscar de filme estrangeiro. Nos últimos dias foi divulgado que Jack Nicholson estaria interessado em viver o papel em uma provável versão norte-americana. Toni Erdmann “combina” com Nicholson, que anda afastado das telas, mas será que, “enquadrado” na fórmula de Hollywood, o trunfo desse filme será preservado? A conferir.
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