Atendi ao telefone. Quem falava era uma moça muito educada. Feita a apresentação, de repente ela desatou a falar numa velocidade estonteante. Pensei: o que houve com aquela moça tão doce e suave que começara a falar agora como locutora de corrida de cavalo?
Enquanto a falação seguia, lembrei-me que havia colocado a água do café para esquentar. Tentei explicar a situação. Mas ela não me escutou e foi adiante emendando as palavras sem pausa. E eu não sabia ainda nem qual era o assunto.
Fui verificar a temperatura da água e deixei que ela conversasse um pouco com o telefone. Voltei. Ela continuava a falar como se nada tivesse acontecido. Tossi. Ela continuou o discurso. Tossi de novo – uma, duas, três, quatro vezes. E ela não dava sinal de que alguma coisa estaria ocorrendo. Comecei a achar esquisito.
Larguei mais um pouquinho o telefone. Fui escrever alguns trechos de uma crônica que ficara de mandar ainda hoje para um amigo. Notei o quanto aquela conversa havia atrapalhado meu dia. Mas consegui escrever o texto a tempo e enviei para o amigo.
Ao voltar para a sala, notei que o telefone estava ainda ligado. Pior: ela continuava a tagarelar. Já não tinha a voz tão bonita assim. Olhei para o relógio. Estava completando agora três horas desde que ela ligara. Então fui dar cabo daquela história.
Desliguei o telefone bem devagar, deixei depois fora do ganho e fui tomar um gole de café. Mas logo pensei que outro alguém poderia ligar. E fiquei olhando para aquele treco que falava.
Olhei bem pra ele. Aquele negócio estava me enchendo.
– Cala essa boca!
Resolvi deixar o telefone calado por alguns dias. Quando fui finalmente ligar o aparelho, pensei bem. Dá que aquela moça ligue de novo.
Deixei o falante desligado por tempo indeterminado.