As plantas falam. Pode parecer ficção científica ou exagero de minha parte, mas a ciência já tem provado há anos que plantas se comunicam entre si e com outros organismos ao seu redor, como insetos e fungos.
Até mesmo aquela samambaia pendurada na varanda da casa de sua tia tem voz.
É simples de se “ouvir” o que elas falam, basta ir a um bosque ou a um jardim e respirar profundamente. O cheiro que você irá sentir ali são as palavras. Esse cheiro produzido por elas, como de eucalipto, laranja, folhas verdes, grama cortada, é chamado de compostos orgânicos voláteis, e as plantas produzem milhares deles, e juntos eles se misturam para formar as frases e as sentenças que elas precisam para enviar recados e serem entendidas.
Essas “palavras” têm muitas funções, uma delas para avisar às outras plantas sobre algum perigo se aproximando, outra função é para atrair insetos para a polinização. Nós também usamos essas “palavras”, mas como licença poética para sentir seus perfumes.
Como as plantas não podem se mover e devem permanecer no mesmo lugar onde cresceram, elas desenvolveram a habilidade de produzir compostos voláteis para conseguir sobreviver e, sem isso, a vida ali seria bastante difícil para elas.
Mas, a atividade humana está interferindo nisso, e a poluição atmosférica está ameaçando essa comunicação e muitas espécies já não são mais capazes de se comunicar da mesma maneira que antes.
Imagine que as plantas percam a capacidade de atrair insetos para a polinização! Você seria capaz de imaginar o tamanho do impacto que isso causaria na produção de alimentos? Sem a polinização, a produção de alimentos cairia para níveis em que seria impossível alimentar a tanta gente; se hoje pessoas já morrem de fome…
De que maneira elas se comunicam? Existem diversas maneiras, cito aqui um exemplo que acontece com o milho. Um milharal sabe reconhecer quando está sendo atacado por lagartas. Quando as lagartas famintas estão devorando suas folhas, o milho aprendeu a reconhecer na saliva das lagartas uma substância chamada de volicitina. Quando o milho percebe a presença da saliva da lagarta, ele imediatamente começa a produzir um composto volátil que é liberado no ar.
Esse composto consegue viajar grandes distâncias até ele ser percebido por um tipo de vespa, uma inimiga e predadora natural de lagartas. As vespas então reconhecem esse composto como um grito de socorro e vão até o milharal para devorar as lagartas. O mais interessante desse efeito é que pesquisadores imitaram as mordidas das lagartas e, utilizando uma pequena tesoura, eles faziam pequenos cortes idênticos às mordidas da lagarta nas folhas, mas o milho não emitia nenhum sinal químico. O sinal, ou o grito de socorro, só era produzido quando a saliva da lagarta estava presente. Um processo adaptativo brilhante.
Esse efeito de chamar insetos para socorrer ocorre muito frequentemente na natureza e diversas outras plantas trabalham em colaboração com eles.
Uma vez, realizamos aqui na Inglaterra um estudo parecido. Para tanto, utilizamos a lagarta Diatraea saccharalis ou a broca da cana de açúcar. Essa lagarta ataca plantações de cana-de-açúcar. Observamos que as folhas da cana-de-açúcar também emitiam esses gritos de socorro quando em contato com a saliva da diatraea. Um dos gritos de socorro produzidos pelo milho e pela cana-de-açúcar é chamado de cariofileno, e sua função é a de atrair predadores.
Entendendo de que maneira essas comunicações ocorrem, podemos propor métodos mais eficientes no combate a pragas agrícolas e também na produção de alimentos.
Mas, como eu disse acima, cientistas estão descobrindo que a poluição atmosférica e o excesso de ozônio estão interferindo nestes sinais e deixando as frases sem sentido, que já não são mais entendidas pelas plantas e nem pelos insetos. De uma maneira mais simples, posso dizer que a atividade humana está destruindo as mensagens enviadas pelas plantas. Cito um exemplo que ocorre com o limoneno. O limoneno é também uma das palavras utilizadas pelas plantas. Ele tem cheiro de laranja e está presente no óleo de cítrus e em muitas outras espécies de plantas. Quando o limoneno entra em contato com o ozônio presente no ar, ele reage rapidamente e se converte em outros compostos que já não são mais reconhecidos por outras plantas ou por outros insetos.
Quimicamente dizendo, o limoneno reage com o ozônio gasoso numa reação chamada de ozonólise e, como resultado, temos um limoneno degradado que se converteu ao que chamamos de aldeído, nem de longe o mesmo composto com cheirinho de laranja. Não é somente a linguagem que é destruída, mas também a distância em que ela é ouvida. Muitos compostos voláteis produzidos pelas plantas conseguem viajar pelo ar por centenas de quilômetros.
Quando eu era criança e morava em Cajobi, lembro-me das noites de verão e do cheiro doce e, às vezes, insuportável que uma planta chamada de Dama da Noite produzia. O cheiro era bem forte a parecia que a planta estava ali na sala de casa, quando, na verdade, ela estava a uns dez quarteirões dali.
Hoje, os excessos de gases emitidos por escapamentos, como óxido de nitrogênio e outros, degradam esses cheiros, e o que antes conseguia viajar centenas de quilômetros hoje já não é sentido nem a 200 metros dali.
Um trabalho realizado em jardins de grandes centros urbanos mostrou que os gases, como os emitidos por escapamentos de carros e pela queima de diesel, estão degradando os cheiros das flores. Antes, os cheiros produzidos por um jardim ficavam no ar por até 18 horas e hoje já não ficam por mais de 5 minutos.
Não seria de se estranhar se alguém dissesse que as rosas daquele jardim do centro de sua cidade já não têm mais o mesmo cheiro de antes, não seria uma percepção poética dele, mas um fato científico comprovado.
A solução?
Essa eu deixo para o meu sobrinho de 9 anos, eis que ele me respondeu:
“Devemos plantar mais árvores, encher as cidades de jardins e parar de poluir o ar.”
Uma proposta simples e certeira para fazer as plantas voltarem a falar.