Alonso Luiz era um primo de terceiro grau. E era filho único e bem gordo – gorduchinho, vai; termo menos cruel de me referir a ele. Depois da chegada de minha família à sua casa, eu e meu irmão aceitamos o convite de Alonso Luiz para um passeio a cavalo em sua fazenda, uma fazenda linda nos arredores de Campinas.
Depois de apertarmos a teta da vaca para tomarmos leite, resolvemos sair pelo caminho que Alonso Luiz nos indicava. Ele conduzia o grupo na frente, na condição do proprietário da fazenda, e nós íamos atrás, na qualidade de primos aprendizes.
Estava sendo uma cavalgada como nunca tínhamos feito – aliás, era a primeira vez em que andávamos em algo que não fosse carrinho de rolimã. Ele mesmo cuidara dos assentos, dando ordens aos empregados para isso. E fomos embora. Em certo momento ele pediu para que eu me aproximasse.
Quando cheguei bem perto, no espaço que me dera nas proximidades da cerca de arame farpado, seu cavalo deu um coice na égua que me carregava. E ela me jogou para a cerca de arame.
Eu me debatia entre os arames, meu irmão pulara do cavalo para me acudir, e Alonso Luiz permanecia silencioso, e eu percebia um leve sorriso na face do meu primo. Era um sorriso quase dissimulado. Levinho, vai. Esta era a cara de meu primo.
O tempo passou. Soube depois que a família de meu primo perdera a fazenda, comprara uma casa no bairro em que minha família morava e tocara a vida. Não tive mais notícias nenhuma dele.
Naquele tempo em que me lembrei de Alonso Luiz, eu estava em uma praia no Nordeste, uma praia deserta e repleta de grandes dunas de areia. E distante das dunas, longe da água do mar, tinham alguns casebres de madeira. Em um deles estávamos eu e Denise, uma mulher lindíssima que nascera em Franca, a terra do basquete no Estado de São Paulo.
Em um dia em que trocávamos ideias sobre a vida e olhávamos o mar, é que passei a notar um cavalo que corria pela praia. Fiquei conversando com Denise e atento ao cavalo e toda a sua liberdade. Em certo momento, resolvi me movimentar.
E comecei a me aproximar do cavalo. Mas com total segurança e sem nenhum temor. Cheguei perto dele, olhei nos seus olhos, acariciei seu rosto. Senti que eu poderia montar. Era hora certa. Foi o que eu fiz.
Durante uma hora eu cavalguei à pelo pela praia. Estávamos felizes, eu e ele. Assim que terminou a cavalgada, fiz carinhos novamente nele. E ele me olhava. Beijei-o e fui embora.
Assim que cheguei e me sentei em frente da casa, Denise me elogiou. ”Como foi lindo ver você cavalgando pela praia. Faz muito tempo que você anda de cavalo”?
Lembrei-me do arame farpado.
Fiquei olhando para o mar e sorri.
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