É verdade que quando Cecília Meireles escreveu o poema ‘Ou isto ou aquilo’, em 1964, pensava no universo infantil, no drama diário das crianças de terem de escolher entre brincar e estudar, correr ou ficar tranquilo. Mas quando lembro dos versos, o que me vem à mente é a vida de escolhas de uma mãe.
“É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!
(…) Ou isto ou aquilo; ou isto ou aquilo
E vivo escolhendo o dia inteiro”
Que vontade de estar com um filho e outro ao mesmo tempo, de poder estar lá e cá, de trabalhar e de ficar, de se descolar e de grudar, ‘e vivo escolhendo o dia inteiro’.
No dia em que me tornei mãe, comecei a entender todas as dúvidas da minha mãe. Foi só então que percebi que, além de aprender a tomar decisões sobre mim mesma, eu também passaria a tomar decisões por outras vidas que eu amava tanto (ou até mais) quanto a mim. E, mais adiante, ainda deveria ensinar a fazer escolhas.
E como é que eu podia ter cobrado por certezas? Agora sim eu entendia as incertezas. Cada dúvida, cada escolha entre isto ou aquilo, é a vontade de não errar, de acertar, de fazer o melhor.
E é assim que são as mães. Tentam ser divinas, onipresentes. Mas são humanas, sempre a escolher, porque a vida é feita de escolhas.
Cecília Meireles transformou as escolhas em poesias, grandes ou pequenas são sempre escolhas. Pode ser o brinquedo, pode ser o novo projeto de vida, ou uma nova casa.
A carioca órfã – que perdeu a mãe com dois anos e o pai antes mesmo de nascer – teve de fazer escolhas desde a infância. Teve a sorte de crescer com a avó, mas não pode crescer com a mãe. E dela fez poesia.
Ser mãe é virar poesia. Não há maternidade sem poesia.
Há poesia na comida que se prepara, no beijo e no abraço, no olhar, na impaciência, no choro, no sorriso, na preocupação.
Até na guerra há poesia. No filme “Mil vezes boa noite” (2013), com Juliette Binoche, é difícil não sofrer com a dor daquela mãe que ama a fotografia de guerra, mas ama também suas filhas. Duas opções que ela não consegue conciliar. E a sociedade é cruel com ela, os padrões que lhe cobram são pesados. Em lugar de apoio, ela tem cobrança.
Não é preciso ir à guerra, como no filme, para sofrer estas mesmas dores. As mulheres mães de hoje as sofrem diariamente.
Estamos todas nós, mães, sempre a perguntar: isto ou aquilo?
Ora, mas os homens também não fazem escolhas?
Todos fazem, mas quando a mãe escolhe sobre o filho é sempre uma escolha de amor. É como se não fosse ela a escolher.
E hoje eu aproveito o Blog para falar desta poesia que me dá o Norte: a mãe-poesia. O amor de mãe que me fez ser e o amor de mãe que me faz ser.
Apenas um texto, algumas palavras, uma homenagem de amor a todas as mães-poesia e à minha mãe, Mainha, Dona Decelis, que é pura poesia.
Texto lindo! ,
Obrigada pela indicação do filme.
Sucesso!!!