Crédito: European Space Agency/creativecommons.org
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Caíram direitinho

carlaozinho_0256_1200x600Os sabichões da Interagência Espacial (InterEsp) mijaram de rir nas doutas e imaculadas cuecas/calcinhas quando decodificaram os dados enviados pelo cinturão de satélites de vigilância: “Revoada de unicórnios translúcidos na mesosfera”; “Aproximação crítica de asteroide envolto em escudo de invisibilidade”; “Van lotada por palhaços cósmicos do mal iniciando orbitação”. O mais engraçado era que os “dados” não só se faziam acompanhar de cálculos com fachada de coerência, como se davam ao luxo de produzir imagens hiper-realistas dos “fenômenos”.

O que não estava visível para a gargalhante e elitista plateia da InterEsp eram as frenéticas atividades industriais em curso no cenário insólito pintado pelos dados malucos (também acompanhadas por risinhos, muitos risinhos…).

Os cientistas terráqueos já estavam acostumados com as brincadeiras de “hackers espaciais”, que pentelhavam o mundo sério desde os idos tempos das atividades dos satélites Swift e Fermi, coletores de informações sobre explosões espaciais e energia dos buracos negros. Foi preocupante, no início: na antiga Nasa, a segurança da informação abrangia desde a manutenção de sistemas de e-mail na sede em Washington à proteção de redes na Rússia, onde cidadãos norte-americanos trabalhavam na Estação Espacial Internacional. A agência também precisava proteger enormes quantidades de dados científicos produzidos internamente e controlar sistemas em 20 centros de pesquisa, laboratórios e outras instalações nos EUA.

A maior preocupação era de os hackers interviessem nas comunicações entre a Nasa e uma de suas 65 espaçonaves que transmitiam dados de pesquisa. Também podia ser, perfeitamente, que alguma empresa ou estado tencionasse não só boicotar as pesquisas como assumir ciberneticamente o controle de satélites.

Crédito: Godata Img/creativecommons.org
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A Nasa chegou a registrar mensalmente 2 mil incidentes cibernéticos, incluindo centenas de ataques a partir de websites e aplicativos de internet, além da perda ou roubo de equipamentos, segundo relatórios sobre o desempenho do governo em segurança da informação enviado ao Congresso.

Fora por isso que o objetivo passou a ser o controle da rede interna e trabalhar com as missões espaciais na questão de cybersegurança. Construíram-se satélites e outros instrumentos que fossem seguros antes de serem lançados. Os engenheiros submeteram equipamentos a testes para verificar se conseguiam suportar as condições no espaço, sujeitando-os a vibração severa e temperatura congelante.

A estratégia deu certo, basicamente, ainda mais em se tratando de projetos ambiciosos, como os velhos satélites Swift e Fermi. Os hackers, então, se contentaram com alvos menos ambiciosos, caso do atual cinturão de satélites de vigilância, concebido especificamente para prevenir ameaças reais e iminentes, como asteroides e meteoros com possibilidades de colisão com o planeta. Assim, as investidas dos engraçadinhos passaram a ser cada vez mais inócuas: os pesquisadores já haviam desenvolvido percepção capaz de detectar fraudes infantis. Tinha ficado claro que a ambição dos hackers se resumira a fazer os cientistas “sérios” perderem tempo com averiguações inúteis. Um retrocesso à infância da cybersacanagem…

Crédito: Blog Trepreneur/creativecommons.org
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Daquela vez, no entanto, o que causara espécie e tamanha risadaria nos doutores da InterEsp fora a nota nonsense exibida pelos alertas fakes: ora, unicórnios translúcidos, asteroide envolto em escudo de invisibilidade; van lotada por palhaços cósmicos? Tudo indicava que os antes temidos hackers espaciais estavam sofrendo de franca decadência mental…

De qualquer forma, atenuado o frouxo de risos, os doutores adotaram o protocolo: ignorar as baboseiras e nem se preocupar em perscrutar os quadrantes sugeridos: mais produtivo era focar outros quadrantes, até que o entusiasmo infantil se descolasse dos setores hackeados, o que, por sua experiência, não demandaria muito tempo. Por mais que vans cósmicas entupidas de palhaços aliens realmente fosse uma ideia criativa e doidona.

Crédito: Robert Cupisz/creativecommons.org
Crédito: Robert Cupisz/creativecommons.org

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Enquanto os doutos da InterEsp tratavam de retomar sua “normalidade” profissional, uma imensa estrutura navegadora era montada nos bastidores do cenário fake elaborado. Quando os canhões emissores de plasma estavam devidamente ajustados, os seres riram mais desbragadamente. Foi quando o comandante daquela dissimulada operação deu o sinal verde:

— Guerreiros: estamos pontos pra invadir. E, ante qualquer esboço de resistência, o plasma vai rolar solto!

 

Sobre Carlãozinho Lemes

Antes do jornalismo, meu sonho era ser... astronauta. Meu saudoso pai me broxou: “Pra isso, precisa seguir carreira militar”. Porém, nunca deixei de ir transmutando a sucata anárquica dos pesadelos em narrativas cambaleantes entre ficção científica, uma fantasia algo melancólica, humor insólito e a memória — essa tumba mal lacrada de maravilhas malditas. Assim, é o astronauta precocemente abortado quem proclama: rumo ao estranho e às entranhas!

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