Campinas, 20 de junho de 2013: movimento de três anos atrás foi um aviso (Foto Adriano Rosa)
Campinas, 20 de junho de 2013: movimento de três anos atrás foi um aviso (Foto Adriano Rosa)

Trump, Doria, Crivella: a implosão dos partidos e a crise da democracia

O recado foi dado e é universal. Aconteceu aqui, nos Estados Unidos e há muito ocorre na Europa. As vitórias de Trump (contra as poderosas máquinas republicana e democrata), João Doria (contra os caciques do PSDB, exceto o padrinho Alckmin) e Marcelo Crivella (reafirmando o projeto de poder no segmento neopentecostal) significam, entre outras coisas, a implosão dos partidos como vêm sendo historicamente constituídos e reiteram a projeção dos candidatos-mídia, feitos de acordo com o figurino do espetáculo, das bravatas (ou do bom-mocismo) e do não-diálogo. A democracia em crise e uma mensagem muito clara às oligarquias partidárias, à direita e à esquerda: se não houver renovação, aproximação real com os anseios populares, mais e mais “não-políticos” serão levados aos palácios, municipais, estaduais e federais.

No Brasil as últimas eleições municipais ratificaram o questionamento das estruturas partidárias tradicionais. Siglas normalmente dominadas por homens, ricos e brancos e que, portanto, abrem pouquíssimos espaços para mulheres, grupos sociais com menor poder aquisitivo e para a diversidade étnica e cultural que faz a riqueza e a beleza do país. Os jovens, os grupos femininos, as organizações sociais em geral se veem cada vez menos representadas nestas estruturas que são do começo do século 20, para não dizer antes. Castas partidárias que não refletem mais os sentimentos do povo e muito menos a complexidade dos tempos atuais.

Daí porque grande parte do eleitorado não foi votar ou votou em branco ou nulo. Essa desconfiança, alimentada pela síndrome da corrupção, endêmica à direita e à esquerda, só tende a aumentar, se a aventada reforma política não acontecer de fato, ou se acontecer apenas – como se espera – na superfície, com medidas cosméticas e indolores.

A crise também acontece na esquerda, em geral o campo em que as siglas partidárias encontram maior espaço para a fidelidade a ideias e projetos mais amplos e inclusivos. O impeachment e os recentes resultados eleitorais injetaram muitas perguntas no terreno da esquerda, que precisa repensar muitos de seus conceitos e práticas. Indagações inclusive sobre se ela, esquerda, existe apenas para atuar no território eleitoral. E, claro, sobre como enfrentar o establishment midiático/institucional, que permanece bem fortinho.

Aqui, como nos Estados Unidos, prevaleceu mais uma vez (1) o poder do dinheiro (Trump e Doria são super-ricos e Crivella tem um suporte igualmente poderoso) e (2) o poder da mídia, ainda que o magnata americano tenha se posicionado como um candidato anti-mídia. A sua campanha foi a mais cinematográfica e midiática possível, coroando uma tendência cristalina dos últimos anos. Não houve debate de ideias, mas ataques virulentos.

Crise de representação política, de percepção por parte dos institutos de pesquisa (que precisam reformular muito suas metodologias, que não captam mais a volatilidade do mundo contemporâneo), de sentido da democracia. Os tempos que se avizinham não são nada promissores e consolidam a urgência de novas formas de pensar e agir, necessárias para retratar os turbulentos fluxos da modernidade líquida e incerta.

 

Sobre José Pedro Soares Martins

Mineiro nascido com gosto de café e pão de queijo, ama escrever pois lhe encantam os labirintos, os segredos e o fascínio da vida traduzidos em letras.

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