Vários mitos foram derrubados pela mobilização de junho de 2013 nas ruas brasileiras, e creio que o mesmo tem acontecido em várias partes do mundo, geralmente apontando para a crise das instituições políticas que conhecemos. Um desses mitos é justamente aquele que cerca o sistema político tradicional, de participação do cidadão, a cada dois ou quatro anos, em uma eleição para escolher seus representantes executivos ou legislativos. Este sistema está claramente superado e deve ser pensado outro para colocar no lugar, ou no mínimo para complementar o sistema baseado apenas nessas eleições regulares.
O sistema tradicional não dá conta da complexidade do mundo contemporâneo. Falta uma visão holística por parte das instituições que ainda nos dominam. O mundo de hoje implica em uma agenda muito mais ampla, muito mais complicada do que a narrativa que existia quando essas instituições foram criadas. Estamos na sociedade complexa, como lembra Edgar Morin.
Uma nova geração de direitos vem sendo defendida e demandada há anos, pelas chamadas minorias que, na prática, são majoritárias.
Direito à diversidade em todos seus matizes, a um meio ambiente limpo e saudável, à ternura e à tolerância.
Uma dessas demandas é decorrente da forma como se deu a urbanização no Brasil, assim como em todos países considerados emergentes. Urbanização apressada, sem nenhum planejamento, ou para atender ao planejamento da especulação imobiliária e outros interesses.
O resultado foi o caos, há muito anunciado, em São Paulo e outras grandes cidades. A crise no transporte coletivo motivou a rebelião de 2013, mas existem outros fatores embutidos. A violência, a poluição, a perda de horas preciosas (o tempo, tempo, tempo, diamante sem preço) no trânsito engarrafado.
Faltou visão holística aos planejadores e gestores, também ausente em parte da chamada sociedade civil organizada. Organizações não-governamentais envolvidos em suas pautas, que já consomem muito tempo e energia, mas não considerando outras temáticas igualmente urgentes para o mesmo público que elas atendem ou defendem. Visão holística, intersetorial, apenas em esboço em algumas cidades e comunidades.
O pensamento ecológico pode contribuir muito neste sentido, pois ele é essencialmente ecossistêmico. Mudar os indicadores de riqueza, além da obsessão pelo PIB que não considera os tais elementos não-mensuráveis decorrentes do crescimento econômico.
A sociedade civil organizada precisa se organizar para amplificar a voz das ruas, ajudar a dar direção às pautas legítimas. Uma nova agenda pública, tomara que seja um dos legados do Junho de 2013 no Brasil. Não ouvir o que as ruas diziam, naquele momento, é uma das causas da crise generalizada que estamos vivendo e para a qual não há perspectiva de solução. Mais democracia direta – porque as pessoas não confiam mais no atual sistema político – e o repensar das atuais instituições podem ser o começo da necessária transformação, com uma visão holística, ecossistêmica, como a natureza sempre praticou.