O cenário provocado pela seca nos rios Atibaia, Jaguari, Piracicaba, Capivari e afluentes atingiu em cheio o coração e o cotidiano dos mais de 5,5 milhões de moradores da região entre 2014 e 2015. Muitos municípios tiveram que adotar o rodízio e outras práticas de uso racional da água e o grande símbolo do que o fenômeno climático – aliado a equívocos de gerenciamento – significou para esse território foi a utilização do Volume Morto do Sistema Cantareira para garantir a continuidade do abastecimento na Grande São Paulo e também em muitas cidades das bacias PCJ.
De fato, a situação por pouco não se tornou trágica para uma das regiões mais ricas e populosas do Brasil e uma das razões pelas quais não foram ainda mais fortes os efeitos da forte estiagem é o patamar que atingiu o sistema de gestão dos recursos hídricos nessa parte do interior paulista, tendo como principais agentes indutores a criação e funcionamento do Consórcio Intermunicipal das Bacias PCJ, em 1989, e dos Comitês PCJ, posteriormente.
Em pouco mais de duas décadas e meia, o conjunto das bacias PCJ se tornou uma referência nacional e internacional em gestão das águas, sendo um dos principais indicadores o salto de 3% para mais de 70% no tratamento dos esgotos urbanos. Evolução alcançada, é importante dizer, pelo empenho dos municípios e pelos investimentos feitos sobretudo em esfera federal.
Entretanto, todo esse sucesso apenas foi possível porque tem avançado nessa região uma visão de respeito e valorização dos recursos naturais e um dos fatores determinantes foi a implementação dos programas e projetos de educação ambiental liderados pelo Consórcio PCJ, e particularmente as Semanas da Água, adotadas desde 1994, começando com um projeto piloto em Valinhos. Depois anos depois da histórica Eco-92.
Ao contrário do que tem sido verificado em outras iniciativas de educação ambiental no Brasil, que acabam sofrendo interrupções ao sabor de oscilações políticas, as Semanas da Água do Consórcio PCJ tiveram continuidade e com um envolvimento crescente, até somar mais de 2 milhões de alunos abrangidos até 2014.
Nessa trajetória, marcada pela mudança de hábitos e difusão de novos valores entre milhares de cidadãos, estiveram envolvidas muitas pessoas que têm dedicado sua vida a defender a vida. São os educadores ambientais, formais ou não, responsáveis pela execução das Semanas da Água e outras ações e estratégias motivadas pelo Consórcio PCJ ou pela Câmara Técnica de Educação Ambiental dos Comitês PCJ.
São estes educadores os personagens principais deste livro assinado por Larissa Molina e Vieira Júnior. São eles que, na prática, têm sido os motivadores, os inspiradores de uma caminhada com muitos obstáculos e vitórias e que merece ser melhor conhecida e divulgada.
Mas os desafios permanecem. É praticamente um consenso na comunidade científica internacional, por exemplo, que as mudanças climáticas vieram para ficar e continuarão a produzir eventos extremos, o que para as bacias PCJ pode representar novos momentos de forte estiagem ou chuvas muito volumosas.
Em todo caso a região, como todo o Brasil, deve estar muito melhor preparada, capacitada, para enfrentar as consequências das mudanças climáticas e também para outros dramas de ordem ambiental, decorrentes de séculos de descaso com os recursos naturais no país. O episódio de Mariana (MG), no final de 2015, resultando em um golpe em todo o vale do rio Doce, deixou claro que no Brasil, tão rico em água doce e biodiversidade, muitos continuam não fazendo sua lição de casa, e por isso o país prossegue tão vulnerável a catástrofes ecológicas, quando deveria ser um líder global em sustentabilidade.
Apenas com uma evolução ainda maior, contundente, transformadora, da consciência socioambiental será possível um desenvolvimento sustentável efetivo. Nesse sentido as práticas de educação ambiental são desafiadas a se tornarem mais abrangentes, rumo à construção de verdadeiras Cidades Educadoras, com a execução, como propõem organizações como a Unesco, de uma visão holística e interdisciplinar, de fomento ao pensamento crítico e inovador, de estímulo a uma democracia mais participativa e fortalecimento das múltiplas linguagens artísticas, da ética e da ênfase nos bens comuns. Nesta cidade e sociedade ideais, a própria imprensa, tão importante para a educação socioambiental, será estimulada a ser mais propositiva e sistemática na cobertura em meio ambiente, superando a visão fragmentada e pontual, focada em crises, que geralmente adota.
O que os programas e projetos de educação ambiental já alcançaram nas bacias PCJ, como é registrado neste livro fundamental para se entender o êxito da gestão das águas no seu espaço, é motivo de esperança para que a região continue trilhando um roteiro de ousadia e generosidade.
(Este texto foi escrito como prefácio ao livro “A história contada por nós mesmos”, lançado na última sexta-feira, dia 16 de setembro, em Americana, e que relata a trajetória das pessoas que têm atuado há décadas na educação ambiental na região de Campinas e Piracicaba, nas bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. O livro foi lançado pelo Consórcio PCJ e é assinado por Larissa Molina e Vieira Júnior).