“Barakah com Barakah”é a primeira comédia romântica lançada nos cinemas da Arábia Saudita
“Barakah com Barakah”é a primeira comédia romântica lançada nos cinemas da Arábia Saudita

“Barakah com Barakah”, a primeira comédia romântica da Arábia Saudita

DaniPrandi_0188c_500A imensa placa na entrada da praia em Riad, capital da Arábia Saudita, avisa: proibido nadar, proibido correr, proibido passear com cachorro, proibido… E por aí vai. Em um universo de tantas proibições chama atenção a primeira comédia romântica lançada nos cinemas do país, “Barakah com Barakah”, filme que integrou a seleção do Festival do Rio.

Logo de cara, o primeiro longa de ficção do documentarista Ahmoud Sabbagh, formado em Nova York, avisa: “A pixelização que você vê neste filme é totalmente normal. Não é censura. Repito, não é censura”. Ironia? Aqui e ali, algumas cenas aparecem desfocadas e o tema da opressão diária vivida pelos sauditas, principalmente as mulheres, é evidente na maioria das sequências. Mas “Barakah com Barakah” é uma comédia romântica e, como tal, faz rir e chega a emocionar.

Sabbagh não segue exatamente o script “garota encontra rapaz, eles se apaixonam, algo dá errado, mas tudo dá certo no final” que encadeia a maioria das comédias românticas que vemos por aí. A garota, Bibi (Fatima al-Banawi), tem milhões de seguidores no Instagram e, apesar de não mostrar o rosto, o que é proibido, dá dicas de moda, conselhos de produtos ecologicamente corretos e pontua, aqui e ali, mensagens em tom feminista.

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Ahmoud Sabbagh, formado em Nova York, reconhece a ‘pixelização’ e cumpre seu propósito de fazer rir 

O rapaz, Barakah (o comediante Hisham Fageeh), é funcionário da prefeitura que fiscaliza o uso do solo público. “As ruas podem pertencer a Deus, mas isso não significa que o vendedor de frutas e verduras possa expor suas mercadorias sem permissão”, repete. Durante suas rondas se depara com um sessão de fotos em um terreno baldio e conhece a bela e corajosa Bibi.

Vindos de ambientes tão diferentes, logo se aproximam. A garota, mais por rebeldia, se interessa por aquele rapaz um tanto quanto atrapalhado. Os dois começam a tentar se encontrar mas, na sociedade saudita, é praticamente impossível para uma jovem conversar com um homem por causa da polícia religiosa, onipresente.

“Eu nem consegui tocar em sua mão”, lamenta Barakah para o tio, jogador inveterado, beberrão, que de conselheiro não tem nada. Enquanto tenta entender as regras da atual sociedade, o personagem começa a comparar a cultura saudita de hoje com a da geração de seu tio. Nas fotos antigas vê-se homens e mulheres em público, nada demais para os padrões ocidentais. Ao somar imagens de época, o diretor crava sua mensagem: “Como é que chegamos aqui?”

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O par – que não é bem um casal – é formado por Barakah (Hisham Fageeh) e Bibi ( (Fatima al-Banawi)

Bibi segue desafiando as regras no Instagram enquanto Barakah passa a imaginar mil e uma maneiras de poder encontrá-la a sós. Enquanto isso, o jovem passa a ensaiar Hamlet com seu grupo amador de teatro e cabe a ele se vestir de mulher para interpretar Ofelia. A sequência na qual o rapaz vai comprar um sutiã para seu figurino teatral é hilária.

O casal, que não é bem um casal, vai se conhecendo melhor a partir de furtivos encontros. Sabemos que Bibi foi adotada por um casal muito rico, que seu nome verdadeiro é Barakah – daí o título do filme – e que a garota tem nas mãos a chance de assinar um milionário contrato de publicidade. Já o rapaz, de origem humilde, vem de uma família arraigada às tradições, mas não concorda tanto assim com as regras que é obrigado a seguir, tanto na vida quanto em seu trabalho. A situação sai do controle e o desfecho é um tanto quanto melancólico.

“Barakah com Barakah” foi o vencedor do prêmio do Júri Ecumênico do Festival de Berlim no início deste ano e, desde então, tem rodado festivais internacionais, como o recente Festival do Rio. Chama a atenção pelo inusitado, pela coragem do realizador e, surpreendentemente, por ter escapado da censura.

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Sobre Daniela Prandi

Daniela Prandi, paulista, jornalista, fanática por cinema, vai do pop ao cult mas não passa nem perto de filmes de terror. Louca por livros, gibis, arte, poesia e tudo o mais que mexa com as palavras em movimento, vive cada sessão de cinema como se fosse a última.

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