(Em memória do saudoso Caio Tidei)
Deixei o funeral de um amigo. No caminho, previa o que ia acontecer. Já contei aqui que na cidade alternativa que habitei um dia tinha sempre um poeta cego plantado nas trêmulas esquinas pelas quais eu passava. Até hoje ele adivinha os meus passos e se teleporta para os pontos de encontro. Sempre com um poema na ponta da alma suja de tempo. O daquele dia se chamava Porque me desencantei com a morte. Era assim:
eu me criei no tempo dos enterros desfilantes
matronas crocodilando lágrimas de vela
deveras matraqueavam farfalhantes negras loucas
vestes de todos os meses e praças destes feitos
desta feita sem tragedianacional manchetável
só aceitável naturação de morte unitária por vez
vez que a família arrimada a salvo razoável
véu na cara por tudo isso sem constrição possível só
podia mesmo chorrir que é um jeito ameno
ao menos de ver a morte amadurecer e cair
caiam àquele tempo portas comerciais hipocrizando lucros
seguros de bolsos cujas mãos pinguças amassavam chapéus
malabarisantes transparecendo mataréus de ansiedade do após dever
de ver des-secadas as gargantas cristãs redimidas
midas tocava o pau contabilizando punhetas
que às vezes até incompletas serviam se iam
para o saldo machificante da nossa compleição
PORQUE
eu me criei no tempo dos valores confortantos
que tínhamos mais que punhacelerar maturinós já que
queríamos mortes como aquelas calmatizadas e cidadaneáveis
vez de sermos enxergalagrimados no picaderreiro magistral
não prevíamos que as mortes hoje seriam surtos
curtos necroterizados às escondidas do espetáculo